A ciência revela que o sêmen e seus espermatozoides são um espelho da saúde dos marmanjos


A ciência revela que o sêmen e seus espermatozoides são um espelho da saúde dos marmanjos 
por Manoel Gomes • design Fred Scorzzo e Laura Lalaberry • fotos Gustavo
 


Faz muito tempo desde que a humanidade se deparou pela primeira vez com os espermatozoides. Cheio de ideias e com muita criatividade na cabeça, Anton van Leeuwenhoek (1632- 1723), um curioso holandês que tinha como hobby colecionar lentes ópticas, foi um dos responsáveis pelos primeiros microscópios. E, para testar suas engenhocas, o ilustre morador da cidade de Delft, situada a 18 quilômetros de Roterdã, bisbilhotava diversas substâncias. Até que, em 1677, resolveu examinar mais a fundo o líquido branco proveniente da ejaculação.
Ao ver os pequeninos gametas, o cientista imaginou estar defronte de seres humanos minúsculos, homúnculos em suas palavras, que, dentro da barriga da mãe, cresciam e apareciam. Apesar de soar muito absurda nos dias de hoje, essa teoria foi levada a sério por mais de um século, até que outras investidas científicas conseguiram, enfim, desvendar o processo de reprodução dos seres humanos.


Nesses quase 350 anos de pesquisa, o espermatozoide foi capaz de dizer muito sobre diversas questões reprodutivas. Porém, em pleno ano 2011, a medicina afirma que ele tem uma importância ainda maior do que gerar filhos: seria um reflexo do estado geral de saúde do homem.


Uma investigação conduzida pelo Laboratório de Análise do Espermatozoide de Copenhague, na Dinamarca, que colheu amostras de esperma de 43 mil voluntários entre 1963 e 2001, concluiu que indivíduos com nível superior a 40 milhões de células por mililitro de sêmen viviam mais do que aqueles que possuíam valores abaixo desse patamar. A taxa de mortalidade desses marmanjos foi 43% menor em relação à de seus colegas menos munidos de espermatozoides. Ou seja, o número de elementos reprodutores masculinos está diretamente relacionado à qualidade de vida.


"O esperma que um indivíduo expele hoje é constituído de células que surgiram há mais de dois meses", explica o urologista Paulo Rodrigues, do Hospital Nove de Julho, em São Paulo. Devido ao longo processo de produção, o líquido retrata todos os perrengues pelos quais o organismo daquele sujeito passou nos últimos 60 dias. "Como tem um período de maturação extenso, ele pode de fato mostrar a quantas anda a sua saúde", confirma Rodrigues.


Se o sêmen e o espermatozoide são termômetros do nosso estado de saúde, algumas atitudes podem beneficiar sua produção — em termos quantitativos e qualitativos. E, nessa história para lá de fértil, a obesidade figura no papel de vilã. Um estudo do Laboratório de Biologia Médica de Eylau- Unilabs, na França, mostra que o ponteiro da balança tem uma enorme influência na confecção dos gametas masculinos.


Nos voluntários com sobrepeso, quando o índice de massa corporal (IMC) ficava entre 25 e 29,9, havia uma concentração 10% menor de integrantes desse time reprodutor. E quando o indivíduo era obeso pra valer, com o IMC ultrapassando 30, essa queda chegava a 20%. "O excesso de peso é um distúrbio metabólico. Por trás dos quilos a mais há uma série de problemas que se refletem nos espermatozoides", explica Paulo Rodrigues. Diga-se: os quilos sobressalentes ainda alteram a mobilidade e a vitalidade desses minúsculos corredores.


Outra explicação para déficits na sua linha de montagem está relacionada à temperatura dos testículos. Essa fábrica de espermatozoides trabalha 1 grau centígrado abaixo da temperatura do resto do corpo. "Mais gordura ao redor dessas glândulas genitais causa um aquecimento dos gametas, aniquilando-os", garante o endocrinologista Alexandre Hohl, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia da Regional Santa Catarina.


Outro fator que atrapalha à beça é o fumo. "O cigarro produz substâncias que são tóxicas para a função reprodutora", conta o urologista Sandro Faria, da Sociedade Brasileira de Urologia. A nicotina e os outros ingredientes do tabaco agem diretamente sobre os espermatozoides, diminuindo seu quórum e resultando em mais soldados defeituosos. No final das contas, o drama se instala: a infertilidade, sem contar outros problemas.

A dieta da fertilidade



Se a barriga de chope e a fumaça prejudicam essas células microscópicas, alguns alimentos são capazes de defendê-las e até ajudam a turbinar a sua gênese. "Homens que consomem mais frutas e verduras, boas fontes de antioxidantes, têm um esperma de melhor qualidade", assegura Alexandre Hohl. Algumas pesquisas também indicam que as vitaminas A, C e E, além de minerais como o zinco, devem entrar no cardápio do time da testosterona. Isso porque esses nutrientes costumam aumentar a capacidade de locomoção e a quantidade de espermatozoides no sêmen. Folhas de cor verde-escura, laranja, tomate, peixes, mel e castanhas, por exemplo, dão um fôlego extra ao sistema reprodutor masculino. "É recomendável moderar nas frituras e doces e aumentar a ingestão de fibras, sem se esquecer da prática regular de exercícios físicos e do abandono do tabagismo e do uso abusivo da bebida alcoólica", orienta a endocrinologista Vania dos Santos Nunes. Práticas como essas impactam não só os espermatozoides mas toda a saúde do pessoal que carrega um par de cromossomos XY.


Nesses mais de três séculos, os cientistas deram mais importância ao papel dos gametas masculinos na vida do homem. E lembre-se: se você chegou até o final desta reportagem é porque, nessa insana corrida pela fecundação, um foi o mais rápido, o mais forte e o mais esperto, deixando para trás mais de 300 milhões de competidores. O resultado? A sua vida, a sua saúde.


O fim do macho man?


De acordo com uma pesquisa do New England Research Institute, nos Estados Unidos, os homens de hoje estariam com os níveis de testosterona em baixa — 22% a menos em relação a seus antepassados. "O estilo de vida inadequado é a causa principal das alterações hormonais", atesta a endocrinologista Vania dos Santos Nunes, da Faculdade de Medicina de Botucatu, no interior paulista. A derrocada da testosterona pode acarretar disfunção erétil, perda de massa óssea e muscular, distúrbios de sono e de humor, aumento da gordura abdominal e bem menos libido.


Como é feito o sêmen
O processo entre o início da produção e a ejaculação dura mais de dois meses


1. Nascimento
Os espermatozoides surgem nos testículos graças à divisão das células germinativas.


2. Natação
Depois, se dirigem até o epidídimo, tubo que fica na parte superior desses órgãos.


3. Viagem
Pelo canal deferente, chegam às vesículas seminais, onde se juntam a um líquido rico em frutose.


4. Estoque
Na próstata, a substância recebe outro ingrediente, a espermina, que finaliza a mistura — o esperma.


O notebook e a fertilidade


Cientistas da Universidade Estadual de Nova York, nos Estados Unidos, descobriram que usar o laptop diretamente no colo pode prejudicar a produção de espermatozoides. O aparelho eletrônico superaquece os órgãos reprodutivos masculinos e, como os gametas são sensíveis ao calor, eles acabam morrendo. "No estudo, o notebook se revelou um fator de risco. Ele pode, sim, causar problemas, mas isso varia conforme o indivíduo", diz o urologista Sandro Faria.


SAUDE.ABRIL

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